segunda-feira, 3 de maio de 2010

Fases da Literatura Hispanoamericana


A literatura, tal qual uma mulher, cheia de fases como a lua, não se torna bela devido ao período que vive ou às emoções que sofre. Sua beleza vem da própria essência de ser mulher, de ser literatura, de ser prosa, poesia e poema, de ser solta ou rígida, de ser simples e complexa, de ser realista e romântica, de ser do campo e da luta.
Assim como as dores e as tenebrosas fases da vida, fazem de uma mulher, antes infantil, mais forte e mais amadurecida, assim o é à Literatura. Nenhum estilo seu é menos belo por ser mais escuro ou infantil...tudo faz parte do que ela é. Tudo compõe o seu ser, sua estrutura, sua forma, sua beleza! Porém, cada homem lança sobre ela um olhar distinto; cada um se apaixona por uma característica peculiar ...por ser tão vasto o seu ser, por ser toda ela uma imensidão. Há ainda os que covardemente fogem de seus afagos...covardia ou insanidade? Não querem por ela dispor as próprias almas, atitude inerente somente aos de espírito nobre e bravo.
Tomemos sua fase confusa, dividida, complexa e rebuscada. Era a Barroca que debatia-se contra si mesma. Tal qual uma adolescente complicada, que ainda está por definir seus caminhos, que se confunde com o que lhe dizem e o que deseja, e mesmo sem querer apresenta em suas palavras a rebeldia própria de sua fase. Fala de maneira rebuscada...numa linguagem pouco utilizada. Tem sonhos arrojados, sentimentos alternados. É hiperbólica, paradoxal, mas muito sentimental. Quer alçar vôo, mas logo entra em fase de querer voltar à infância. Neoclássica, volta aos temas de quando era criança. Tem saudades ... de quando era mais grega, de quando era mais romana. Mais serena e ansiosa por liberdade da alma, tão aflita e confusa outrora, influenciou os hispano-americanos em sua cultura e política. Mais equilibrada em seus sentimentos, luta contra a tirania, com armas pesadas, suas palavras, e trejeitos doces e suaves, próprios da mulher.
Logo surge o desejo de amar. Logo vem a fase de romantizar. E essa tal mulher hispano-americana, soube mesmo como amar! Foi intensa....rompeu com a rigidez de sua fase anterior. Agora, buscava um escape da turbulência política e social de sua época. Ela se identificou com o liberalismo europeu, e foi em toda essa fase, sentimental, livre artisticamente , por isso, extremamente subjetiva. Porém, como uma autêntica hispano-americana, revelou identificação com a causa indígena e escravagista. Rechaçou a linguagem convencional e teve em sua defesa, grandes nomes como José Marmól, que com Amália teve uma grande história de amor. Esteban Echeverría uniu-se à Literatura, agora romântica, em seu aspecto mais patriótico possível, sendo El Matadero, sua expressão mais apaixonada de todas.
Essa mulher, embora universal, muitas vezes também foi regional. Não poderíamos esquecer sua fase gauchesca, onde incorporou os costumes, os modos de vida, e a maneira de falar da comunidade gauchesca. Possui nessa fase, uma relação de amor com o homem gaúcho, e exalta em si mesma o folclórico do amado. José Hernandez descreveu essa paixão descabida em Martín Fierro e Juan Moreira, assim como o escritor Ricardo Guiraldes, exaltou esse amor de forma crítica em Don Segundo Sombra. Foi uma fase tranqüila, de campos e costumes rurais. Essa tão instigante mulher, se utilizou de metáforas, neologismos, arcaísmos e termos aborígenes pra descrever aquela fase tão especial.
Uma fase pode ser tão importante, que caracterizá-la por datas, não seria nada arrogante. A mulher geração 80, foi política, consciente, e tinha como referência pensadores do velho mundo,como Taine e Renán, filósofos franceses, e Adam Smith ideólogo da revolução industrial Inglesa. Foi uma fase sem meios termos. Foi uma fase de intelectualidade e nobres interesses. No entanto, como é próprio das fases serem passageiras... logo veio outro momento... outra postura, outra música, outra visão.
Mais experiência? Mais maturidade? Não sei... a beleza que lhe é inerente não torna-se menor. Provavelmente, as circunstancias lhe tomam pela mão, a fim de que veja o mundo sob um foco mais realista... sem capas, sem enfeites, sem manobras, sem rodeios, apresentando-lhe todas suas responsabilidades e encargos. Não pode, justamente por sua sensibilidade, permanecer inerte às condições sociais ao seu redor. Retirou dos olhos as lentes cor-de-rosa, e deixou de lado por alguns instantes, seu idealismo. As drásticas mudanças em seu mundo lhe tornou mais objetiva. Buscou analisar minuciosamente a realidade pra que por ela não fosse dominada, preocupando-se com as questões maiores de sua própria existência. Revela-se diante dos olhos desta mulher realista, as verdadeiras causas e motivações, refletidas nos costumes e nas feições. É a mulher noveleira, que se utiliza deste tão encantador artifício pra denunciar suas impressões de mundo e deixar transparecer os defeitos que julga existirem na sociedade em que vive.
Avançando um pouco mais em seu realismo, busca aprofundar suas reflexões, e busca , ainda na flor da idade, explicar comportamentos seus, comportamento do ser humano. Através de suas experiências, quer descobrir as leis que regem a conduta humana. Busca ela, algo além da aparência .. busca a essência! Quer saber além da conseqüência, procura descobrir a causa. Não gosta do artificial...é em sua forma sublime, a mulher em sua fase natural.
Embora alguns precisem a data do nascimento de tão formosa manifestação divina, essa tal literatura feminina, é bem possível que tenha surgido antes das palavras, antes mesmo de sua expressão. Suas fases se repetem, se renovam, inovam e deleitam... Ninguém julgue-se dono dela, pois tem ela a propriedade de ser eterna. Tem ela a capacidade de registrar como cravados em diamantes o sentimento, os acontecimentos, as frustrações, os sonhos e o próprio existir. Suas fases são belas, simplesmente porque são ela – mulher, literatura, literatura, mulher!

Késia Mesquita

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